No mundo das finanças, buscar soluções mais eficientes para captar recursos é uma constante, tanto para empresas quanto para investidores. Entre as estratégias mais sofisticadas e flexíveis está o crédito estruturado, uma forma de combinação de instrumentos de crédito que permite otimizar custos, mitigar riscos e ampliar o acesso a capital. Apesar de ser mais comum no mercado corporativo e institucional, o conceito começa a ganhar atenção também entre investidores e profissionais do setor financeiro.
Neste artigo, vamos explicar o que é crédito estruturado, como funciona, quais são os principais tipos, seus benefícios, riscos e como essa ferramenta pode ser usada estrategicamente na estruturação de dívidas e investimentos.
1. O que é crédito estruturado?
O crédito estruturado é a combinação de dois ou mais instrumentos financeiros (como empréstimos, debêntures, notas promissórias, recebíveis, derivativos, entre outros) para formar uma estrutura única de financiamento ou investimento, adaptada às necessidades específicas do tomador ou ao perfil de risco desejado pelo investidor.
Essa abordagem permite “estruturar” a dívida ou a operação de forma personalizada, maximizando eficiência tributária, minimizando custo financeiro ou tornando a operação mais atrativa para investidores.
2. Como funciona?
Ao invés de captar recursos por meio de um único instrumento (como um empréstimo bancário), uma empresa ou projeto pode utilizar uma estrutura combinada, como:
- Parte por emissão de debêntures incentivadas (com isenção de IR para investidores),
- Parte por cessão de recebíveis (antecipação de pagamentos futuros),
- Parte por financiamento bancário com garantia de bens,
- Eventualmente complementada por derivativos de proteção cambial ou de taxa de juros.
Essa combinação pode tornar o projeto mais viável financeiramente, com menor risco percebido, atraindo investidores ou bancos dispostos a ofertar taxas mais competitivas.
3. Exemplos práticos
a) Projeto de infraestrutura
Uma concessionária de rodovias pode estruturar um projeto com:
- Debêntures incentivadas para atrair investidores com isenção fiscal,
- Recebíveis futuros de pedágios como garantia,
- Hedge cambial para proteger componentes importados,
- Parceria com banco de fomento para parte do financiamento.
b) Empresa de varejo com expansão planejada
A rede em expansão pode combinar:
- Financiamento bancário para capital de giro,
- FIDC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios) para antecipar vendas parceladas,
- Emissão de notas promissórias para necessidades pontuais.
4. Principais instrumentos usados no crédito estruturado
1. Debêntures
Títulos de dívida emitidos por empresas para captar recursos. Podem ser simples ou incentivadas (com benefício fiscal para investidores).
2. Notas promissórias
Usadas geralmente no curto prazo, com menos burocracia, mas com custo maior.
3. FIDC (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios)
Fundos que compram recebíveis (como duplicatas, boletos, cartões), permitindo antecipação de receitas para a empresa.
4. CRI/CRA
Certificados lastreados em recebíveis imobiliários ou do agronegócio. Usados para captar recursos com foco setorial e isenção de imposto.
5. Derivativos
Instrumentos usados para proteger a operação contra variações cambiais ou de juros.
5. Por que utilizar crédito estruturado?
✅ Redução do custo financeiro
Ao combinar fontes mais baratas de crédito (como debêntures incentivadas) com outras formas de captação, é possível obter uma taxa média de financiamento mais competitiva.
✅ Gestão de risco personalizada
O uso de derivativos ou garantias específicas permite reduzir o risco percebido pelos credores.
✅ Acesso a um público mais amplo de investidores
Com a estrutura certa, é possível atrair tanto bancos quanto fundos de investimento, pessoas físicas e investidores institucionais.
✅ Flexibilidade contratual
É possível adaptar prazos, carência, amortização e condições a cada fase do projeto.
6. Crédito estruturado como investimento
Não só empresas se beneficiam: investidores também buscam operações estruturadas como forma de diversificar sua carteira e melhorar a relação risco-retorno.
Exemplos incluem:
- Participação em FIDCs que compram recebíveis de empresas com boa performance.
- Investimento em debêntures estruturadas com garantias reais ou subordinadas.
- Aportes em CRIs ou CRAs com estruturas de tranches (diferentes níveis de risco e retorno).
Essas aplicações, quando bem avaliadas, oferecem rentabilidades superiores à renda fixa tradicional, com risco mais controlado do que ações ou derivativos puros.
7. Riscos envolvidos
Apesar de suas vantagens, o crédito estruturado envolve riscos relevantes:
⚠️ Risco de crédito
Mesmo com garantias, existe o risco do emissor não honrar os pagamentos. Avaliação de crédito é fundamental.
⚠️ Risco de estrutura mal planejada
Uma combinação mal feita pode gerar excesso de alavancagem, cláusulas conflitantes ou descasamento de fluxo de caixa.
⚠️ Baixa liquidez
Muitos desses instrumentos não têm negociação em mercado secundário, dificultando a saída antecipada.
⚠️ Complexidade jurídica e regulatória
Exige assessoria especializada e due diligence minuciosa.
8. Papel dos estruturadores financeiros
As operações de crédito estruturado geralmente contam com o apoio de:
- Bancos de investimento;
- Consultorias financeiras;
- Gestoras de recursos;
- Escritórios de advocacia especializados.
Esses profissionais ajudam a montar a estrutura ideal, coordenam as partes envolvidas, garantem o cumprimento das normas e elaboram a documentação jurídica da operação.
9. Tendências no Brasil
Com a queda estrutural da taxa de juros no país nos últimos anos (embora em 2024-2025 estejamos num ciclo de aperto monetário), o mercado brasileiro passou a buscar alternativas à renda fixa tradicional, impulsionando:
- Crescimento dos FIDCs e CRIs/CRAs;
- Maior interesse de investidores pessoa física em debêntures estruturadas;
- Uso mais sofisticado de garantias reais, fianças e seguros de crédito;
- Avanço da tokenização de ativos como forma de estruturar operações via blockchain.
10. Quando faz sentido usar ou investir em crédito estruturado?
Para empresas:
- Grandes projetos com múltiplas fontes de receita;
- Expansões que exigem financiamento de longo prazo;
- Necessidade de diversificar fontes de captação.
Para investidores:
- Buscando rentabilidade acima do CDI, com controle de risco;
- Com conhecimento técnico ou assessoria especializada;